• 15 de abril de 2025
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BR-364

A concessão da BR-364: um retrocesso disfarçado de avanço

Análise crítica dos impactos sociais, econômicos e ambientais da privatização de uma das principais rodovias do país.
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A recente divulgação do edital de concessão da BR-364, no trecho que liga Rondonópolis (MT) a Jataí (GO), trouxe mais frustração do que alívio para quem acompanha há anos a discussão sobre a necessidade de duplicação dessa importante via. Em um momento em que o Brasil busca modernizar sua infraestrutura logística, especialmente em estados estratégicos como Mato Grosso, o modelo proposto para esse contrato parece andar na contramão do desenvolvimento.

Rondonópolis não é apenas mais uma cidade do interior de Mato Grosso. Trata-se de um importante polo logístico nacional, localizado no entroncamento das BRs 163 e 364, além de abrigar o maior terminal intermodal da América Latina. Não por acaso, o município possui a sétima maior frota de caminhões do país – a maior do estado. Esse protagonismo logístico está diretamente ligado à vocação agropecuária de Mato Grosso, líder na produção agrícola nacional, que precisa de estradas eficientes para escoar sua produção com competitividade.

Nos últimos anos, houve avanços importantes: a duplicação da BR-163, a pavimentação de milhares de quilômetros de rodovias estaduais e a chegada da ferrovia trouxeram ganhos expressivos para o setor produtivo. No entanto, quando se esperava que a concessão da BR-364 representasse mais um passo nessa trajetória de modernização, o que se viu foi uma proposta tímida e, em muitos aspectos, decepcionante.

Do total de mais de 490 quilômetros abrangidos pela concessão, apenas cerca de 45 km serão duplicados – menos de 10%. No trecho mato-grossense, entre Rondonópolis e Alto Araguaia, o número é ainda mais simbólico: apenas 8,55 km. O restante continuará sendo pista simples, com eventuais trechos de terceira faixa. Tudo isso sob um contrato de 30 anos, prorrogáveis por mais 30, o que significa que a discussão sobre a duplicação da BR-364 pode ser adiada por até seis décadas.

Mais preocupante ainda é o valor do pedágio previsto no edital. Uma viagem de Rondonópolis a Pedra Preta, por exemplo, pode custar cerca de R$ 17. Para quem segue até Alto Araguaia, na divisa com Goiás, o valor ultrapassa os R$ 30. E tudo isso para trafegar por uma rodovia que permanecerá em sua maioria inalterada, com todos os riscos e limitações que uma pista simples oferece.

O cenário é especialmente preocupante diante do potencial de crescimento da produção agropecuária em Mato Grosso, que deverá intensificar ainda mais o fluxo de caminhões e veículos de passeio nos próximos anos. A concessão deveria ser uma oportunidade de resolver um gargalo logístico histórico. No entanto, sem a duplicação efetiva da rodovia, corremos o risco de perpetuar os mesmos problemas que há décadas comprometem a eficiência e a segurança da BR-364.

É urgente que o governo federal, os órgãos reguladores e a sociedade civil revejam os termos dessa concessão. Não podemos aceitar pagar caro por uma infraestrutura que não atende às demandas do presente – e muito menos às do futuro.

 

Alexsandro Silva é economista com mais de 15 anos de atuação profissional em consultorias e assessorias, com predominância em acesso à financiamentos empresariais e incentivos fiscais para Mato Grosso.