Após perder mãe e irmão na pandemia, jovem supera tragédia e conquista maior nota do Enem em Mato Grosso
Seramar Alveni Daud, 18 anos, alcançou 980 pontos na redação de 2024 e sonha cursar Medicina para salvar vidas após a perda da mãe e de um irmão durante a pandemia Foto: Reprodução
A conquista de Seramar Alveni Daud no Enem 2024 é daquelas histórias que transcendem números e colocam a superação como protagonista. Aos 18 anos, a jovem, natural de Vilhena (RO) e moradora de Mato Grosso, obteve 980 pontos na redação — a maior nota do Estado, façanha alcançada por apenas quatro estudantes de escolas públicas em todo o território mato-grossense. Mais do que um desempenho acadêmico, o resultado é a síntese de uma trajetória marcada por resiliência, disciplina e um propósito claro: estudar Medicina para salvar vidas.
O caminho até esse feito começou muito antes da aplicação da prova. Seramar fez o ensino fundamental no Colégio Sagrado Coração de Jesus e concluiu o ensino médio no La Salle. Em 2024, iniciou o cursinho preparatório no Lavoisier, mantendo uma rotina intensa: aulas das 7h às 12h na escola e, à tarde, das 14h às 19h10, no cursinho, de segunda a sexta-feira. Aos fins de semana, revisava conteúdos, resolvia exercícios e se dedicava a um caderno especial com repertórios e eixos temáticos para a redação, cada um acompanhado de contextualizações curtas e precisas.
Mas o desempenho excepcional tem um pano de fundo emocional doloroso. Quando tinha 14 anos, Seramar perdeu a mãe, Raja Daud, em 18 de abril de 2021, e menos de um mês depois, em 3 de maio, o irmão Nafez Antônio Daud, vítimas da pandemia. A tragédia abalou profundamente a família, composta por quatro irmãos — Munif, Nafez, Aziza Luíza e Seramar. Foi o pai, Jamal Daud, quem, com amor e determinação, manteve a unidade familiar e deu à caçula o suporte necessário para seguir estudando e sonhando.
A estudante relembra que em 2023, no segundo ano do ensino médio, fez o Enem sem qualquer estratégia definida, sem saber administrar o tempo para equilibrar a redação e a prova objetiva. Acabou deixando para passar o texto a limpo na folha oficial nos minutos finais e só conseguiu escrever sete linhas — o que levou à anulação do texto e à nota zero. “No ano seguinte, alcançar 980 foi uma surpresa muito boa, fruto de muito trabalho e esforço, junto com a minha professora de redação Bruna Annjos, do meu cursinho, que me ensinou a escrever sem me engessar em modelos prontos. Ela me mostrou como usar meus próprios recursos e estilo para fazer um texto de qualidade”, relata.
Apesar da nota expressiva e do reconhecimento como a maior pontuação na redação do Enem 2024 em Mato Grosso, Seramar ainda não conseguiu vaga na universidade pública. Programas como o Fies e o Prouni exigem comprovação de renda familiar de até três salários mínimos — critério no qual sua família não se enquadra. Determinada a alcançar o objetivo, ela segue firme no cursinho preparatório e mantém a rotina intensa de estudos, com a mesma dedicação que a levou ao desempenho histórico.
O resultado também rendeu um reconhecimento nacional. No dia 11 de agosto, Seramar esteve em Brasília para participar do evento de premiação do Ministério da Educação (MEC), realizado no Palácio do Planalto. Na ocasião, foi presenteada com um smartphone iPhone 13 e um iPad de nona geração como reconhecimento pelo desempenho obtido na redação do Enem.
“Foi um trabalho em conjunto, meu e dela (a professora). Tirar essa nota foi uma surpresa boa tanto para mim quanto para ela. Nós duas ficamos muito felizes e foi algo surpreendente”, afirma. Agora, ela projeta os próximos passos com a meta de, em breve, transformar sua história de perda em uma trajetória de cura e esperança para outros, alcançando o sonho de vestir o jaleco de médica.