Comitiva do Ministério da Saúde visita abrigos de migrantes em Boa Vista
A comitiva do Ministério da Saúde enviada a Roraima visitou, no último fim de semana, todos os 8 abrigos de migrantes erguidos em Boa Vista – além deles, houve visitas às instalações da Operação Acolhida em Pacaraima, na fronteira entre Brasil e Venezuela, durante a semana. A equipe, formada por integrantes das secretarias Executiva (SE), de Atenção Primária (Saps), de Atenção Especializada (Saes) e da Força Nacional do SUS (FN-SUS), conversou com gestores e beneficiários para avaliar as complexidades do local na recepção dos migrantes que vêm do país vizinho.
Os especialistas do ministério estiveram no abrigo Janokoida, no Rondon 1 – o maior de pessoas migrantes da América Latina -, passando também pelo Rondon 5 e pelo Abrigamento Temporário de Refugiados (ATR-2), bem como no Posto de Recepção e Apoio (PRA), no Jardim Floresta e no Pricumã, finalizando a sessão de visitas no Waraotuma a Tuaranoko, destinado a comunidades indígenas.
Há 6 mil pessoas abrigadas em Boa Vista, além das 579 alojadas em Pacaraima. Para além dos números, são mulheres com crianças nos braços, homens com filhos maiores no encalço, netos com seus avôs. Pessoas que chegam ao Brasil em busca de emprego, serviços de saúde e melhores oportunidades para os filhos. “Vim em busca de trabalho, consegui e já estou para trazer minha família”, comenta Jesús, 29, que hoje atua como ajudante de pedreiro na capital roraimense.
Enxergam no Brasil uma oportunidade. “Estou aqui há seis meses e mal consigo acreditar”, conta Javier, 54 anos, que sofre de miocardiopatia. “Já estou na fila para tratamento e possivelmente na próxima semana já consiga um diagnóstico mais preciso”, explica o beneficiário do abrigo Pricumã, no bairro homônimo, na capital do estado.
O atendimento em saúde a essas comunidades de pessoas migrantes, tanto em Boa Vista quanto em Pacaraima, são feitos na atenção primária local, através das Unidades Básicas de Saúde (UBSs), por onde entram no Sistema Único de Saúde (SUS) e, por força constitucional, têm garantido o atendimento e encaminhamento para tratamentos de maior complexidade, caso necessário.
Consultora técnica da FN-SUS, a antropóloga Camila Medeiros identificou algumas complexidades que, apesar dos esforços dos gestores locais, apresentam-se na lida com as pessoas em trânsito. “Como desafios, nos foram apresentadas as barreiras linguísticas de acesso à saúde e, também, a necessidade de mediação entre o saber tradicional e o saber biomédico, em que há margem para divergências sobre o que se considera a condução mais adequada dos processos terapêuticos”, pontua.
No Centro de Coordenação e Interiorização (CCI), onde os migrantes são encaminhados à interiorização, diversas empresas se apresentam com interesse em contratar os migrantes. De acordo com Niusarete de Lima, representante do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), há uma checagem dos antecendentes das instituções, como possível presença na lista de trabalho análogo à escravidão, e se estiver tudo certo, as vagas são ofertadas aos migrantes.
“Atualmente, são pelo menos seis empresas que têm setores de recursos humanos já dentro do CCI”, conta ela. Em 2024, foram 21.802 venezuelanos transferidos a outras cidades. E, desde 2018, esse número chega a 144.503 pessoas interiorizadas.
Povos tradicionais
O abrigo Waraotuma a Tuaranoko (“espaço dos warao”), o maior destinado a indígenas da América Latina, com capacidade para 1.500 pessoas – hoje conta com 1.362 ocupantes. Lá, o esporte é visto como essencial.
“Os warao são muito competitivos, querem ganhar em todos os aspectos. Venceram campeonatos municipais de futebol e chegaram a ganhar com folga do time formado pelos militares da Operação Acolhida”, brinca Nádya Silveira, gestora do local. Conhecidos como “povo da água”, porém, os warao não são a única etnia presente no local. Apesar de serem majoritários – representando 70% dos beneficiários – há também representantes de outros sete grupos étnicos no Tuaranoko.
Há, também, muitos artesãos e artesãs, sobretudo entre as comunidades tradicionais. Com traços de ancestralidade, cunham produtos que são vendidos em feiras dentro dos próprios abrigos ou ao redor de Boa Vista, com preços de R$ 10 a R$ 180, e, em maior parte, feitos a partir da fibra do buriti. Para Camila, da FN-SUS, há uma relação de respeito às tradições de cada povo. “Há uma preocupação com a participação comunitária e o respeito às especificidades culturais de cada etnia, como a organização de comitês que engajam os grupos no planejamento e condução das ações para o abrigo”, comenta.
Fake news e incertezas
A comitiva do Ministério da Saúde está em campo para avaliar como pode auxiliar para que não haja desassistência aos migrantes e para que o acréscimo gerado pelo fluxo migratório não gere gargalos e prejudique o atendimento à população local. A agência da Organização das Nações Unidas (ONU) que atende os migrantes na região havia suspendido os serviços na última semana. Na segunda-feira (3), o atendimento foi normalizado no Posto de Triagem (PTrig) e no PRA.
Dentro dos abrigos, é frequente perguntas a respeito do futuro de quem já se deslocou de um país a outro. Com a disseminação de informações falsas, pessoas migrantes e refugiadas passam a temer as consequências da saída de agências humanitárias da região, o que implicaria em desassistência a quem mais precisa.
Olavo David
Ministério da Saúde
Fonte: Ministério da Saúde