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Justiça do Trabalho marca audiência com viúva de trabalhador que morreu com 90% do corpo queimado

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Jorge Tedeia, que completaria 35 anos no dia 7 de setembro, faleceu após 15 dias na UTI sem tratamento adequado. Audiência de conciliação será nesta segunda-feira.

Desde o dia 30 de junho passado, quando ficou viúva, Marizete Lemes Simões tem vivido com o mínimo, juntando dor, dívidas e anseios. Ela está, agora, juntamente com a filha de 14 anos, na expectativa de que se faça justiça com a aproximação da primeira audiência do caso da morte do seu marido, o trabalhador Jorge Tedeia, que será em 13 de setembro de 2021, em audiência on-line da Comarca de Sorriso. Jorge Tedeia morreu há cerca de dois meses por complicações de um acidente de trabalho, após ter 90% do corpo queimado durante o conserto de uma caldeira na empresa em que trabalhava, no município de Sorriso (MT). Com apenas 34 anos, Jorge passou 15 dias em tratamento na Unidade de Terapia Intensiva(UTI), entubado em um hospital sem Centro de Tratamento de Queimados (CTQ), e sem condições adequadas para tratá-lo. Não recebeu suporte com a rapidez necessária e, no dia 30 de junho, faleceu.

A viúva do trabalhador começou a semana que antecede a audiência com R $15,00 no bolso. Ela começou a receber o valor de R$ 1.150,00 em agosto, a título de concessão provisória de urgência de tutela, por determinação da Justiça do Trabalho, o que não está sendo suficiente para ela e sua filha. Ela e a filha dependem 100% desta renda para despesas básicas como medicamentos, supermercados e a educação da adolescente, mas a conta não bate. Na última quarta-feira, outro valor de R$ 1.150,00 caiu na sua conta bancária mas Marizete diz que já está no sufoco. Sua tarifa de energia elétrica já estava atrasada (R$ 120,00), precisará pagar o aluguel do mês de setembro (R$ 750,00), bancar a despesa de internet para as aulas on-line da filha (R$ 50,00) e de água (R$ 40,00). Vão sobrar pouco mais de R$ 200,00, levando em conta os R$ 15 que Marizete tinha no bolso no início da semana.

O desafio, segundo a viúva, será equilibrar o orçamento com as despesas de alimentação e de medicamentos (de depressão, que custam R $120,00 para ela e a filha). “Vou ter que empurrar as contas para frente”, adianta ela, que nem foi atrás da fatura do cartão do marido, vencida desde o mês de julho. “Tá lá no posto dos Correios há dois meses. Não tenho dinheiro para pagar”, conta ela, que não tem Código de Endereço Postal na rua onde mora, e, por isso, tem que caminhar cerca de dois quilômetros para pegar qualquer correspondência na agência postal dos Correios.

Marizete Simões continua morando em Sorriso, mas precisou se mudar há um mês, por não conseguir arcar com o aluguel antigo, no valor de R $1.000,00. Economizou R $250,00 com o novo aluguel e também nas despesas de internet e de água, já que compartilha com a dona da casa. Ela mora agora num puxadinho de dois quartos no fundo do quintal. Alimenta a esperança que haja entendimento na audiência de conciliação, agendada para a próxima segunda-feira. “Espero que haja entendimento de que não quero nada além do que é meu direito. Por causa da negligência, do abandono, afinal, eles tinham ciência do problema gravíssimo do meu marido com 90% do corpo queimado.Eu quero justiça.”, afirma a viúva.

A ajuda que ela está recebendo foi decorrente do pedido feito pelas advogadas de defesa dela e da filha feito no dia 22 de julho passado, e concedido pela Justiça. “As provas indicam que houve negligência patronal, não tendo agido a reclamada com cautela diante dos fatos narrados, nem a tempo de evitar um mal maior”, assegurou o Juiz do Trabalho Substituto Fabio Luiz Pacheco, que deferiu a tutela provisória. No caso de não cumprimento da obrigação, a empresa fica sujeita à multa de R$ 3 mil por dia, limitadas a 30 dias.

Luta pela sobrevivência

A luta da família para que o marido de Marizete conseguisse sobreviver às queimaduras em 90% do seu corpo começou em meados de junho, quando ele foi transferido para um hospital de Lucas do Rio Verde que não tinha CTQ. No dia 26 de junho, um laudo médico assinado por um médico do próprio hospital indicava a necessidade dele ser transferido para uma unidade de saúde com divisão de queimados. Não havia unidade disponível no SUS. Foi necessário recorrer à Justiça para que a perspectiva de atendimento adequado fosse viabilizada. No dia 29 de junho, foi obtida a liminar que determinou que a empresa transferisse o empregado para um hospital com CTQ em até 48 horas – mas isso não significava, segundo a defesa da vítima, que a empresa empregadora precisava esperar o prazo final, porque cada segundo contava. Antes mesmo do cumprimento final da liminar, no dia 30 de junho, devido às graves queimaduras e complicações, Jorge não resistiu. “Ele poderia ter sobrevivido com dignidade se tivesse sido socorrido mais cedo, tinha uma equipe toda esperando por ele no hospital de Ribeirão Preto (SP), que tinha CTQ”, comentou a advogada Cristina Pezzella.

A viúva do trabalhador precisa, além da audiência de conciliação, aguardar outros desdobramentos de processos judiciais na esfera da Justiça Estadual e também Federal. A defesa de Marizete também precisará entrar na Justiça Comum (Estadual) com uma ação de retificação da certidão de óbito de Jorge Tadeia, pois o documento saiu sem o nome da viúva (cita apenas que ele é casado e tem um filho) e isso impede que ela tenha acesso a benefícios do marido como INSS. Também será necessário entrar com um alvará na Justiça Federal, a jurisdição de competência para os casos que envolvem o saque do FGTS. As guias emitidas pela empresa para saque do Fundo de Garantia não constavam o nome da viúva. “Além disso, a empresa fez um cálculo errado das verbas rescisórias, pois o funcionário não recebia nenhum adicional – noturno, de periculosidade ou insalubridade -, correspondentes à sua função, então, tudo isso precisará ser revisado”, informou a advogada Cristina Cereser Pezzella.

Toda a assistência jurídica de Marizete e da sua filha está sendo feita desde o dia 26 de junho pelo escritório Cereser Pezzella – Consultoria em Direito, com sede em Porto Alegre/RS, que decidiu assumir o caso em caráter pro bono. Inicialmente, foi dada entrada em Ação Cautelar visando a transferência imediata de Jorge para uma UTI com Centro de Tratamento de Queimados (CTQ), mas ele faleceu 24 horas antes do prazo concedido pelo juiz para que a transferência fosse feita para um hospital de São Paulo. Depois que o trabalhador morreu, a defesa entrou com um pedido de indenização pela morte do funcionário com um pedido de liminar por tutela antecipada, o que foi concedido pela Justiça do Trabalho em Sorriso.

Entenda o caso

O acidente aconteceu, de acordo com relatos das advogadas de defesa, quando o trabalhador estava em uma escada, a uma altura de aproximadamente 3 metros, fazendo manutenção em uma correia que passa por cima de uma caldeira – recipiente metálico usado para aquecer líquidos ou produzir vapor -, por volta das 22 horas do dia 15 de junho. Durante o trabalho, os gases produzidos na caldeira tiveram uma reação espontânea, vindo a atingir e queimar Jorge. Ele também caiu da escada após ser atingido pelo vapor.

Jorge trabalhava na função de auxiliar de subproduto na empresa Marombi Alimentos e tinha sido admitido em 10 de outubro de 2018. O que ele fazia na hora do acidente, de acordo com suas advogadas, extrapola a sua função. “Além disso, ele não tinha capacitação para tal e não utilizava Equipamento de Proteção Individual (EPI ‘s). Jorge estava, portanto, em desvio de função, cobrindo um funcionário que estava ausente”, acrescenta a advogada Cristina Luz.

Logo após o ocorrido, Jorge Tedeia foi para um hospital em Lucas do Rio Verde, a 360 quilômetros de Cuiabá. “Desde então,

a família do empregado vinha tentando compor, de forma amigável com a empresa, um tratamento adequado e que garantisse a sobrevivência de Jorge, diante da gravidade das lesões – ele teve 90% do corpo queimado -, além do transporte da esposa, Marizete, até o hospital, que se localizava em outra cidade, Lucas do Rio Verde, para prestar o devido acompanhamento, já que ela não tinha condições financeiras para fazer isso”, relata a advogada Cristina Cereser Pezzella.

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