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Judiciário aposta em Escola Inclusiva para não perder talentos para as ruas

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De uma hora para outra a rotina de um adolescente de 13 anos* mudou. Estudante assíduo, passou a faltar às aulas, ir mal nas provas e suas notas despencaram. Cursando o 8º Ano do Ensino Fundamental II, da Escola Municipal Senador Darcy Ribeiro, no Jardim Industriário I, em Cuiabá, o aluno contou com o olhar atento do professor de Artes e padrinho da turma, Caíque Santos Silva, que percebeu a mudança comportamental, comunicou a unidade de ensino que pode intervir para manter o talento nos bancos escolares.
 
“Em sala de aula já percebia uma carência afetiva do aluno. Ele não foi registrado pelo pai, o que já configura o abandono paterno. Às vezes ele faltava por uma semana inteira, não conseguia acompanhar o conteúdo”, relata o professor. “Puxei uma conversa e ele foi se abrindo, contou que morava com avó que estava acamada, a mãe tinha problemas psicológicos e o padrasto, que o levava para a escola, tinha saído de casa. Então toda o cuidado com a casa ficou para o menino. Muitas vezes o irmão menor não tinha com quem ficar e ele não podia ir a escola para cuidar do caçula”, narra Caíque.
 
Tímido, o adolescente conta que tinha muito medo de falar na escola sobre os problemas de casa e ser obrigado a ir para algum abrigo e deixar a família. “Eu amo minha avó e minha mãe, elas precisam de mim”, declara. O garoto afirma que a rotina é corrida, mas mão reclama. Ele mora no bairro Osmar Cabral, precisa estar pronto às 5h30 para o padrasto dar carona até a escola, que abre os portões às 6h45. A aula termina às 11h30 e ele volta de ônibus. Chega em casa depois das 12h30 e precisa preparar o almoço, dar atenção a avó e a mãe, cuidar dos afazeres doméstico e só então se preocupar com os deveres escolares.
 
“Eu ajudo minha mãe com as coisas de casa, mas tem vez que ela não está bem. De vez em quando que eu brinco com meu irmão de 8 anos, porque ele mora com meu padrasto e vai para casa visitar minha mãe”, ameniza.
 
Prevenção
 
O estudante é o primeiro beneficiado pelo projeto piloto de prevenção à evasão escolar realizado pelo Poder Judiciário de Mato Grosso (PJMT), por meio da Comissão Especial sobre Drogas Ilícitas do TJMT e do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec), em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá (SME) e as escolas Darcy Ribeiro e Escola Municipal de Educação Básica do Campo (EMEBC) Nova Esperança, situada na Rodovia Cuiabá-Santo Antônio.
 
Os parceiros se uniram com o objetivo de realizar ações conjuntas na criação de projetos de melhoria das escolas, no plano de atividades auxiliares e complementares, que tenham por finalidade oferecer escolas mais inclusivas e participativas, visando sempre propiciar melhores condições de ensino, a busca de soluções preventivas e terminativas de conflitos, a atenção preventiva de uso de drogas nas escolas, a formação na consciência das implicações de violência doméstica e no conhecimento e valorização de direitos humanos.
 
O diretor da escola, Lauro Flávio Sebalhos, destaca que a Darcy Ribeiro já tem 25 anos de fundação e atualmente atende 876 alunos no período matutino e vespertino. Está localizada em uma região afastada do centro, em volta de indústrias, que emprega muitos pais de alunos. “São pais que ficam o dia todo trabalhando e não conseguem acompanhar os filhos na escola, então para evitar a evasão escolar precisamos pensar projetos. Temos o ‘Quem falta faz falta’, que acompanha a frequência dos alunos e conversa com a família para manter a criança na escola”, destaca.
 
Foi por meio desse projeto que o caso do adolescente chegou ao conhecimento do Grupo de Trabalho de Prevenção e Tratamento da Dependência Química, formado pelo judiciário e representantes de segmentos envolvidos na questão, como prefeituras, secretarias, Governo do Estado, Assembleia Legislativa, associações terapêuticas e o judiciário.
 
O professor Caíque e a coordenadora pedagógica visitaram a casa do estudante e ofertaram auxilio para que o adolescente continuasse assistindo às aulas. “Mediamos para que o padrasto continuasse dando carona para o garoto até a escola, ates de ir para o trabalho. Conseguimos o vale-transporte para ele voltar para casa, a mãe e avó foram encaminhadas para assistência social e tratamentos de saúde. Elas são beneficiárias de programas sociais”, cita o diretor. “Em dois meses o estudante é outra pessoa. Voltou a ser assíduo e as notas foram recuperadas”, completa.
 
“O perfil do estudante é muito comum na escola. Se não houvesse esse trabalho preventivo dos parceiros, a sociedade certamente perderia esse talento para às ruas, pois é uma porta aberta para a evasão e até para o tráfico”, alerta Lauro Flávio Sebalhos.
 
Projeto piloto
 
As duas escolas participantes da iniciativa foram mapeadas pela SME que apontou quais unidades necessitavam de uma intervenção mais efetiva por parte do poder público. São escolas localizadas em bairros periféricos, com grande número de ocorrências de violência doméstica, tráfico e uso de entorpecentes. Além disso, a escola precisa ser entendida pela comunidade como um local de acolhimento, um espaço que funcione como porta de entrada para os projetos.
 
O desembargador Mário Kono, presidente do Nupemec e coordenador da Comissão Especial sobre Drogas Ilícitas do TJMT, reforça que a questão antidrogas é muito importante, mas não é única preocupação do projeto. “Queremos trabalhar pelo fim da violência. Ensinar desde cedo os direitos e deveres das crianças e adolescentes, sobre resolução de conflitos, dar formação em Direitos Humanos e cidadania. Não queremos só a prevenção, mas sim um futuro melhor para toda a sociedade”.
 
Kono destaca que tradicionalmente, a luta antidrogas investiu na repressão, um pilar importante que deve continuar existindo, mas que não mostrou efetividade para inibir o suso de entorpecentes. “Temos que trabalhar meios de reduzir a demanda, e uma dessas formas são as escolas inclusivas, um ambiente escolar seguro e agradável que ofereça um leque maior de opções para as crianças e adolescentes do que a rua oferece”, reforça.
 
O desembargador afirma que a ação é inspirada no projeto Justiça em Estações Terapêutica e Preventiva do Juizado Especial Criminal (Jecrim) de Várzea Grande,que atua com o sistema multiportas, com parceiros dos mais diversos segmentos para que realmente detecte e resolva o problema. “A questão tem que ser resolvida por toda sociedade: Poder Judiciário, prefeituras, Estado, líderes religiosos, líderes comunitários, pais e mães. Estamos começando com duas escolas em Cuiabá para mensurar os resultado e lutar para mais unidades adotar o modelos. É uma luta que vale a pena, se quisermos mudar alguma coisa no nosso planeta”, comenta.
 
Responsabilidades dos parceiros
 
Pelo projeto são responsabilidades do NUPEMEC: Fomentar a capacitação dos educadores e profissionais que atuam nos estabelecimentos de ensino, no programa de mediação de conflitos escolar, auxiliar no desenvolvimento de projetos de cidadania e valorização do ser humano como sujeito de direitos e obrigações.
 
A Comissão Especial sobre Drogas Ilícitas deve preparar e buscar recursos para a execução dos projetos que visem propiciar sistemas inclusivos e direcionados à prevenção ao uso de drogas.
 
A Secretaria Municipal de Educação se compromete a buscar adesão dos profissionais ligados à educação para realizarem as capacitações ofertadas, bem como integrar como agentes participativos nos projetos a serem desenvolvidos e executados nas referidas escolas.
 
*Nome mantido em sigilo para preservar a imagem, identidade e intimidade do adolescente.
 
#Paratodosverem. Esta matéria possui recursos de texto alternativo para promover a inclusão das pessoas com deficiência visual. Descrição de imagens: Imagem 1 – Foto horizontal colorida do adolescente. Ele aparece de costa, assim como os colegas de sala. Está sentando em fileira na sala de aula, veste camiseta marrom e boné vermelho. Em frente a lousa branca estão o diretor e uma professora. Imagem 2 – Foto horizontal colorida do professor Caíque. Ele está na frente da escola, veste camiseta óculos pretos. Imagem 3 – Foto horizontal colorida da fachada da escola. Imagem 4 – Foto vertical colorida do desembargador Mário Kono.
 
Alcione dos Anjos/Fotos: Alair Ribeiro
Coordenadoria de Comunicação da Presidência do TJMT
imprensa@tjmt.jus.br

Fonte: Tribunal de Justiça de MT

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